Em um intervalo de apenas alguns dias, a Secretaria da Educação de São Paulo anunciou a polêmica medida de dar dinheiro para que estudantes com notas baixas participassem de aulas de reforço e revogou o chamado vale-presente, antes mesmo que ele fosse adotado.
O vale de R$ 50,00 para os estudantes ‘em recuperação’ de matemática provocou indignação entre pais, professores e especialistas e foi mais um dos muitos projetos de Educação lançados no Estado, sem ouvir a comunidade escolar e sem levar a consideração o processo de ensino/aprendizagem dos milhares de estudantes da rede pública.
São mais de 5 milhões de alunos e aproximadamente 220 mil professores submetidos a projetos eleitoreiros e oportunistas. “Projetos ditos sensacionais em um dia evaporam no dia seguinte. Isso ajuda a explicar por que são pífios os indicadores de desempenho escolar no Estado mais rico”, diz a repórter especial da Folha de S.Paulo, Laura Capriglione em artigo publicado na edição desta terça-feira (17/08).
Indignada, a presidente da Comissão de Educação da Assembleia Legislativa, a deputada petista Maria Lúcia Prandi, protestou hoje em plenário contra a falta de projetos e a irresponsabilidade do governo tucano com a Educação.
As reportagens mais recentes publicadas no site da Bancada do PT são um indicador do tamanho do problema: “Descumprimento de metas nas gestões Serra/Alckmin agrava crise do ensino médio em SP”, “Governo Serra desviou R$ 660 milhões do ensino básico” e “Em São Paulo, alunos terminam o ensino médio com conhecimento de 8ª série”.
Leia aqui a íntegra do artigo “A insustentável leveza”, de Laura Capriglione (Folha de S.Paulo, 17/08/2010)
Insustentável leveza
É de estarrecer a forma como se comporta o governo do Estado de São Paulo quando o assunto é educação. Agora, uma medida que se chegou a apresentar como revolucionária cai por terra antes mesmo de ser aplicada. Trata-se do chamado "vale-presente" -a Secretaria da Educação daria R$ 50 a alunos que, em dificuldades com matemática, não faltassem a aulas de reforço.
Houve quem visse no "presente" propósitos eleitoreiros, outros acusaram-no de premiar o fracasso escolar (bons alunos não concorreriam ao benefício), outros ainda de ser antieducativo, já que, ao prazer do aprendizado, que deveria ser o alvo do processo pedagógico, se anteporia a força da grana.
Ocioso, agora, discutir as objeções. O que assombra é a leveza beirando a irresponsabilidade com que o secretário Paulo Renato Souza anunciou o cancelamento do programa, ontem, na Folha: "É um projeto que está muito cru", disse ele. "Muito cru", secretário?
Tem sido assim a condução da educação pública paulista. Projetos ditos sensacionais em um dia evaporam no dia seguinte. Isso ajuda a explicar por que são pífios os indicadores de desempenho escolar no Estado mais rico.
E não melhoram, como o próprio Paulo Renato foi obrigado a reconhecer à vista dos resultados do último Saresp (Sistema de Avaliação do Rendimento Escolar do Estado de São Paulo): "Numa avaliação média, eu diria que tivemos uma estagnação", admitiu, confrontado com o fato de que a performance em matemática no ensino médio chegou a regredir entre 2008 e 2009.
Em português e matemática, a nota dos alunos do 3º ano do ensino médio atesta que eles têm competência abaixo da que seria esperada para alunos da 8ª série do ensino fundamental. São 15,5 anos de administrações tucanas em São Paulo.
Uma criou a Escola da Família, outra desidratou-a. Primeiro se trombeteou que professores temporários sem qualificação para lecionar seriam demitidos. Depois o propósito foi abandonado. "Minha primeira obrigação é garantir aula", disse o secretário, como se alguém discordasse.
Até uma incrível parceria entre a cantora pop Madonna e a Secretaria da Educação chegou a ser alardeada, com direito a foto do secretário e do então governador José Serra em troca de sorrisos com a "Material Girl".
A ideia era aplicar um tal "programa educacional baseado em princípios cabalísticos" na rede pública. "Não é propriamente um programa formal, mas para desenvolver psicologicamente. Para enfrentar melhor a vida", disse Serra à época. Foi só a mãe de Lourdes Maria voltar para casa e nunca mais se falou no assunto. Seria tudo uma piada se não se tratasse das vidas e esperanças de tantos jovens.
LAURA CAPRIGLIONEé repórter especial da Folha.