Terra
Na próxima quinta-feira, o senador Aloizio Mercadante (PT-SP) completa 56 anos. Formado em Economia pela USP (Universidade de São Paulo) e mestre na ciência pela Unicamp (Universidade de Campinas), acredita estar preparado para administrar o maior Estado do País. Faz duras críticas ao PSDB, que venceu as quatro últimas eleições em São Paulo, e diz que o governo tem uma atitude "autista" ao não reconhecer os problemas ligados ao transporte coletivo, ao trânsito e segurança pública, entre outros. Critica a educação, que classifica de desoladora, mas defende e mantém conversação com Gabriel Chalita, ex-secretário de educação de Alckmin, para concorrer a uma vaga ao Senado em sua chapa. Aposta na transferência de votos de Lula para levar o PT pela primeira vez ao governo do Estado. Vê em Dilma Rousseff um grande potencial de crescimento para a disputa à presidência da República e afirma que o excesso de praças de pedágio tira a competitividade de São Paulo. Mercadante recebeu a reportagem do Terra em sua casa, na zona oeste da capital paulista, na última segunda-feira. Leia os principais trechos da entrevista:
Terra - Em 2006, o senhor teve uma votação razoável para o governo do Estado de São Paulo, mas perdeu no primeiro turno para José Serra (PSDB). O que leva o senhor tentar novamente o cargo?
Aloizio Mercadante - Em 2006 eu tive a melhor votação do PT para o governo do Estado no primeiro turno, com 32% dos votos. E como senador eu fui o mais votado da história do Brasil e de São Paulo. Isso fez com que as principais lideranças do partido, inclusive o presidente Lula, acreditassem que eu seria o candidato com melhores condições de vencer as eleições. Agora, o cenário de 2010 é muito mais favorável. O governo Lula hoje é o mais bem avaliado da história documentada do Brasil. Nós mostramos que sabemos fazer mais e melhor do que a gestão do PSDB de Fernando Henrique Cardoso. O País tem hoje uma inflação menor do que tinha. Cresce duas vezes mais do que era o crescimento dos últimos 20 anos. Temos uma distribuição de renda que é inédita na história. Além disso, nós achamos que São Paulo é um Estado fantástico, tem a melhor base industrial de serviços, a agricultura mais moderna do País, e que poderia estar impulsionando o desenvolvimento do Brasil com muito mais vigor. As mesmas pessoas vêm se alternando no poder nos últimos 27 anos. O meu adversário ficou no governo 12 anos, como vice-governador e governador. E mais um ano como secretário de governo. Então é preciso renovar, ter alternância, ter ideias novas. Porque os problemas de São Paulo estão se agravando.
Terra - Quais problemas?
Mercadante - O trânsito em São Paulo faz com que as pessoas percam por dia hoje duas horas e 43 minutos, em média. Isso significa 35 dias úteis no ano. Perdidos, sem remuneração e longe da família. Porque essa gestão não foi capaz de planejar investimentos estruturantes na área de transporte público. Eles abandonaram a ferrovia no interior, privatizando a Fepasa. Deveríamos estar implantando um trem bala Campinas-São Paulo-São José dos Campos. Nós deveríamos estar discutindo projeto de trem rápido, usando esse tronco de trem prioritário Ribeirão Preto-São Paulo, Sorocaba-São Paulo. E na Grande São Paulo, nós estamos andando a 15 km/h no horário do pico da tarde. Nós estamos na velocidade de uma galinha. É um negócio inacreditável, por falta de investimento em Metrô. Eles (PSDB) construíram 1,2 km por ano, em média. O México, que começou junto com São Paulo tem 230 km de Metrô.
Terra - Mas o governo paulista argumenta que não tem apoio do governo federal para as obras do Metrô...
Mercadante - Eu achei incrível essa declaração. Meu adversário diz que não tem um centavo do governo federal para o Metrô. Eu imaginei que, como o Serra não queria ele como candidato, e nem o Goldman, que disse que ele não seria o melhor candidato do PSDB, que poderia ser falta de informação, porque eles não repassaram essas informações. Mesmo no governo dele (Alckmin), teve participação do governo federal no Metrô. No dia 26 de junho de 2006, o BNDES liberou R$ 313 milhões exatamente para aquele trecho da linha 2 que ia até o Alto do Ipiranga, estação que foi inaugurada posteriormente. Só para a linha 2 são R$ 1,5 bilhão. Além desse dinheiro, tem mais R$ 270 milhões do Ministério das Cidades. Isso para um projeto de R$ 2,1 bilhões. O governo federal tem uma participação decisiva, muito mais relevante do que recursos do próprio governo estadual. Na linha 5, o BNDES aportou R$ 776 milhões, está aprovado o financiamento. O problema é que eles fizeram uma licitação que foi cancelada. O que falta é agilidade, competência na gestão. Caiu estação do Metrô em Pinheiros, licitações mal feitas que são anuladas, caiu o viaduto do Rodoanel...
Terra - O senhor tinha uma possibilidade real de se reeleger ao Senado. No começo houve até uma resistência sua de aceitar disputar o governo de São Paulo, pela possibilidade de ficar sem mandato. Acredita que possa vencer?
Mercadante - Eu acredito que nós temos todas as condições de vencer as eleições. É verdade que o meu adversário sai - de acordo com as pesquisas iniciais que apareceram - com 50%, 49% das intenções de votos. Mas ele saiu para a prefeitura com 45% dos votos. E não foi nem para o segundo turno. Teve 22% depois de estar 12 anos no governo do Estado, ter sido candidato à presidência da República. Isso mostra que há um cansaço, que há espaço para um projeto novo, que São Paulo quer mais velocidade, mais realização e que merece mais. Estamos fazendo a mais ampla aliança que já tivemos. Se você ler o discurso de anteontem do meu adversário, no lançamento da candidatura, não tem uma menção ao problema do trânsito, do transporte coletivo em São Paulo, não tem uma menção à deterioração de todo os indicadores de segurança pública em São Paulo, como aconteceu ano passado, e está acontecendo esse ano. Não tem uma menção à situação desoladora da educação no Estado de São Paulo, não tem uma menção à qualidade do esquema de saúde. O governo tem uma atitude autista, como se nada disso tivesse acontecido na vida do paulistano e do paulista. Eu acho que é isso que vai fortalecer a nossa candidatura, construtiva, propositiva. Não vou ficar falando mal de ninguém, nem mal do passado, que nós temos de enfrentar e apresentando propostas viáveis.
Terra - O senhor citou a educação. Existem críticas dentro do PT, de uma possível chapa como o Gabriel Chalita (PSB) para o Senado. Ele foi secretário de Educação da Gestão Alckmin (2003-2006), tão criticada pelo senhor. Não há uma incoerência nisso?
Mercadante - Nós mantivemos a porta aberta, não fechamos ainda a chapa a vice e nem ao Senado, exatamente buscando ampliar com todos os partidos que dão sustentação ao governo Lula também em São Paulo. Estamos caminhando fortemente nessa direção. Se o PSB quiser estar na nossa chapa, o espaço estará aberto. E o Chalita tem uma série de qualidades intelectuais, de experiência, e acho que a atitude dele de se afastar do projeto do qual ele fazia parte para apoiar o governo Lula, para apoiar a ministra Dilma, é muito bem recebido da nossa parte. Queremos sim que ele participe da nossa campanha e contribua. Agora, a situação da educação é desoladora. O secretário de educação que nós temos em 2010 é o mesmo de 1983. São 27 anos que essas pessoas administram a educação em São Paulo.
Terra - O senhor fala que a política de aliança de agora foi a maior que o PT já fez. Quando você traz para a aliança, o PDT, que nos últimos anos esteve ao lado do Alckmin... Quando do outro lado você vê o Alckmin trazendo para a chapa Orestes Quércia (PMDB), rival histórico do partido. Isso não confunde um pouco o eleitor, essa política do quanto mais melhor?
Mercadante - Nós temos seis centrais sindicais no País. Uma parte do movimento sindical não apoiou a eleição do presidente Lula. No entanto, hoje, todas as centrais sindicais apoiam o governo Lula. Isso aconteceu porque teve distribuição de renda, geramos emprego, melhoramos salários, demos crédito. Tiramos 23 milhões de pessoas da pobreza, 30 milhões de pessoas ascenderam à classe média... Em São Paulo nós vamos ter o apoio muito forte do movimento sindical. Tenho uma relação pessoal com eles. Fui neste fim de semana no congresso do PDT, com 1.350 delegados, de 273 cidades, e foi aprovado por unanimidade o apoio à nossa candidatura. O PDT tem uma trajetória de luta, o Brizola, o trabalhismo... É um encontro muito positivo para a minha candidatura.
Terra - E o peso do presidente Lula na eleição aqui em São Paulo? O senhor acredita mesmo em transferência de voto? Em 2008, a Marta Suplicy tentou voltar à prefeitura e apesar de o presidente Lula estar sistematicamente aqui em São Paulo, não conseguiu...
Mercadante - Ela foi para o segundo turno, derrotou o meu adversário, inclusive. Espero repetir o mesmo e vencer a eleição no segundo turno. Eu acho que havia muita resistência em São Paulo ao Lula. Historicamente. Tanto em 2002, quanto em 2006. Mas hoje São Paulo aplaude o governo Lula. O governo federal é mais bem avaliado que o governo estadual. E isso mostra que o Brasil e São Paulo perderam tanto tempo acreditando na política do medo de nossos adversários . Quando o Fernando Henrique Cardoso, no lançamento da pré-candidadatura do seu partido, volta a dizer "meu Deus, se eles ganharem...", no mesmo dia o presidente Lula dá uma entrevista ao El País e diz: "ganhe quem ganhe, o Brasil está bem encaminhado". A nossa atitude é diferente. A gente ganha a eleição porque nós fizemos mais. Vamos ganhar a eleição porque temos projeto para o futuro, porque a gente distribuiu renda...
Terra - Na prática, isso convence o eleitor médio?
Mercadante - Eu acho que demoraram tanto tempo para acreditar no Lula e hoje o aplaudem. Por que não acreditar no Mercadante? Nós vamos fazer em São Paulo o que fizemos para o Brasil. Acho que esse é um discurso muito forte, concreto, objetivo. Uma parte não acreditava. Dêem uma chance para mostrar que podemos fazer em São Paulo o que fizemos no Brasil.
Terra - Por que o PT nunca venceu uma eleição no Estado de São Paulo?
Mercadante - A cada eleição a gente vem crescendo. Havia insegurança em relação ao Lula, não tinha segurança que seria um bom governo, hoje aplaudem. Eu acho que esse é um fator novo, que mostra que temos condição de vencer.
Terra - O senhor acredita que possa haver jogo sujo nestas eleições, de ambas as partes?
Mercadante - Eu vou fazer uma campanha com toda a minha garra e luta para vencer, mas faço questão que sejam preservadas as relações pessoais, por sinal, como eu consegui preservar com ele (Alckmin) ao longo de todos esses anos.
Terra - Como tem se saído a Dilma Rousseff neste início de campanha? Está dentro do que o PT esperava?
Mercadante - Vamos crescer muito, a partir de agosto, com a televisão e com o rádio. Acho que a Dilma tem uma experiência administrativa espetacular. E se o nosso adversário diz que o governo Lula vai bem e quer continuar, então deixa a Dilma trabalhar. Foi ela que coordenou o governo no segundo mandato. O presidente Lula reconhece isso publicamente. Quem entende de futebol sabe que em time que está ganhando não se mexe. Tem de mexer em time que está perdendo. E esse é o time que está ganhando. O fato de ela não ter disputado eleição não significa que ela não tenha uma intensa vida política. Se dizia o seguinte, que o Lula não podia ser presidente porque não tinha experiência administrativa. Provou o contrário. Temos segurança da experiência administrativa da ministra Dilma. Deixa a Dilma trabalhar.
Terra - O senhor já está trabalhando no plano de governo?
Mercadante - Intensamente. Intelectuais de fora do partido estão participando dessas discussões, gente do governo federal, com experiência em muitas áreas que nos interessam estrategicamente. Esperamos apresentar essa equipe brevemente, toda ela.
Terra - No interior o senhor tem falado muito do preço dos pedágios. É possível fazer modificações, com os contratos vigentes?
Mercadante - Temos de partir de um diagnóstico. Há ou não um abuso de pedágio em São Paulo. Eu acho que há. Não só o número de praças, 227, quanto o valor da tarifa. Eu estava conversando com o prefeito Gustavo Reis em Jaguariúna, ele me contou uma situação fantástica. Ele tem um amigo que mora em Jaguariúna. De Jaguariúna para Campinas são 18 km. Você paga R$ 7,90 para ir e R$ 7,90 para voltar. Esse rapaz trabalha em Indaiatuba, na Toyota, paga mais um tanto de pedágio e faz a PUC à noite. Então, ele paga R$ 40 por dia, R$ 9.500 de pedágio por ano. Algumas regiões do Estado estão vivendo uma situação que perdeu a racionalidade econômica. Dizer que as estradas de São Paulo são as melhores, já eram antes do pedágio. O pedágio ajuda a manter em bom estado. O que não pode ter é abuso. Prejudica a competitividade da economia e a renda das famílias.
Terra - E como mexer nisso?
Mercadante - Todo contrato tem uma cláusula que se chama equilíbrio econômico financeiro. Vale tanto para ajuste favoráveis à empresa, como deve valer para ajustes favoráveis ao consumidor. Aumentou o fluxo de veículos brutalmente. A economia melhorou muito em termo de volume de negócios. O próprio governo do Estado está usando novos parâmetros. É preciso repactuar isso.
Vagner Magalhães - Direto de São Paulo